terça-feira, 22 de novembro de 2011

O silêncio

                                      Taktishang - templo budista nas montanhas do Himalaia

O silêncio
O vão entre as palavras
Entre as sílabas
Entre as letras
Entre o som
O silêncio
A ponte entre o desejo 
E a vontade
Entre o querer
E a ação
O silêncio
O espaço entre as pessoas
Entre as almas
Entre o outro 
E o ser
O silêncio
O prelúdio da linguagem
O vazio
O desejo 
De abster


Dhara Gasparini

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

O mito do corpo


   
    Estou sentada na pedra ainda, tirando algumas coisas da mochila para continuar a travessia. Pelo visto, vou ficar aqui um bom tempo. Assistindo uma coleção de DVDs sobre os ensinamentos de Joseph Campbell (achada por acaso na estante do meu tio), entendi que preciso dar uma boa analisada nos meus "mitos pessoais". No que venho acreditando? Através dessa análise, posso conhecer minhas crenças arraigadas e questionar se elas me levarão de fato onde quero chegar. Acho que, de plano, consigo vislumbrar uma que não está sendo útil: a busca do corpo perfeito. Preciso libertar-me do "mito do corpo".


O mito do corpo 

    O corpo, na sociedade contemporânea, é o novo totem. Se antes olhávamos através dele para encontrar a divinidade de cada um, hoje o encaramos diretamente para que, pela sua imagem, alcancemos o êxtase. As pessoas não buscam mais pautar suas vidas por uma série de mandamentos morais para atingir uma existência superior; elas pautam-na por mandamentos científicos que lhe tragam um corpo perfeito através do qual possam gozar de uma existência interessante.

    Nem todos conseguem adequar sua realidade orgânica a um corpo idealizado. A estes, resta a sensação de ter chegado à festa de gala da vida sem a vestimenta apropriada. Uns preferem não entrar, por vergonha. Outros usam de artifícios  para que sua roupa se pareça com uma de gala. Há ainda aqueles que, para não serem considerados inferiores, buscam camuflar a inadaptação com outros atrativos, como poder, dinheiro e conhecimento.

    Alguns chamam este fenômeno de ditadura do corpo. Eu, particularmente acho que o melhor termo seria mito. Não há uma força a nós externa que nos obriga a agir de determinado modo, independente daquilo que acreditamos; é mais uma voz dentro de cada um que nos leva a acreditar piamente que apenas a conquista da estética nos levará à plenitude do prazer. Lógico que a semente da crença vem de fora, da mídia, da necessidade de adequação, do outro. Mas seu significado e quanto ela nos afeta, de acordo com a experiência vivida por cada um,  é o que constrói ou não o mito.

Dhara Gasparini

domingo, 13 de novembro de 2011

Primeiros sintomas da travessia

             
               Sinto os primeiros sintomas da travessia. Que frio na barriga! A estrada de asfalto, que me trouxe até aqui, não serve mais como caminho. Deveria eu pegar uma estrada de chão? Uma trilha em mata fechada? Um atalho? Enquanto não sei que caminho seguir, sento numa pedra e descanso um pouco. É que todas as certezas que carrego em minha mochila começam a pesar. Preciso reorganizá-la, livrando-me do peso extra. Abro o zíper e enfio a mão bem fundo, tentando pegar uma das primeira coisas guardadas. Olho bem para o que tenho nas mãos: a competitividade. Desde muito cedo ela já estava na bolsa. Será que ainda serve? Não sei, mas pesa muito: ser melhor, sempre, em tudo. Melhor é jogar fora. Mas antes tiro um pedacinho e guardo: a vontade de me superar.


Dhara Gasparini

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Autenticidade ou repetição?


              

         Há quem diga que, na seara artística, tudo já foi dito, cantado e escrito - mas será mesmo? Se assim for, nossa criatividade não é mais do que a reedição de antigos pensamentos, tornando-se refém da velocidade lancinante dos tempos modernos e seu "boom" de inventividade e originalidade. 

     E se assim não for? Talvez então tenhamos que  assumir a responsabilidade pela  repetição. Tendemos a nos expressar da mesma forma que nossos antecessores, revisitando quase que inconscientemente nossas influências artísticas. Nada de errado, afinal, fazemos isso desde crianças: brincamos de imitar os adultos. É possível até que essa capacidade de imitação seja o fio invisível que une as pessoas, formando a fascinante teia da civilização.

       Repetir é mais fácil e seguro, ajuda a encontrar o outro e escapar da solidão. Mas não traz tanto prazer quanto criar. Nossa angústia existencial - a busca por um sentido na vida - provém do fato de que somos criadores e não estamos criando. Não a criação burocrática, pelo mero reconhecimento, mas aquela que deixa doente, que parece não caber dentro de nós. 

        É no limiar entre a dor e o prazer que se encontra a fonte de toda inspiração: a dor de separar-se, o prazer de viver uma existência autêntica. Apenas quem aceita a dualidade enxerga a unidade - é preciso separar-se para fundir-se.

                                                            Dhara Gasparini

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Inquietação


Caos em grego Χάος (Kháos), do verbo χαίειν (khaíein), abrir-se, entreabrir-se, significa abismo insodável.


Sinto novamente aquela inquietação. 
É um nervosismo que sobe pela espinha 
                              e deságua no maxilar. 
Queria poder me virar do avesso 
                             para encarar a face física da angústia.  
Nesse momento, minhas ideias não são suficientemente boas 
                             para convencer a loucura a não tomar posse do meu corpo. 
Já existe o caos que toma conta de mim. 
Ele me envolve em seus braços como um caloroso amante 
                             tomado pelo desejo de posse. 
Seu toque é tão profundo que não tenho qualquer defesa contra ele. 
Minh'alma começa a escapar pelo nariz,
                             teima em tentar levitar meu corpo. 
Meus olhos reviram e preferem permanecer fechados 
                            para não se cegarem com a luz. 
Quero tocar o intangível. 
Quero despir-me de mim.


                                    Dhara Gasparini

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Vozes




                  Escuto vozes, mas não são do além. São vozes em mim que desconheço. Elas sempre estiveram aqui, desde quando eu era menina. Antes escutava  muito e entendia pouco; hoje escuto menos e entendo mais.

                                                          D. G.

sábado, 5 de novembro de 2011